04/01/2007

A LUTA DE UM POVO

A LUTA DE UM POVO (*)
Victor Jerónimo

Eu era apenas um jovem de 25 anos, mas que tinha um passado de lutas e desgostos internos pelo que se passava no meu país.
Naquela manhã de 25 de Abril de 1974, às 07:00h vi os tanques de guerra, as chaimites e todo um exercito de metrelhadoras a ocuparem as ruas da minha capital.
Intimamente orei para que fossem bem sucedidos.
Cerca de um mês antes tinham tentado a revolução e tinham sido mal sucedidos, dando azo a que todos os seus intervenientes tivessem sido presos pela famigerada PIDE/DGS, a polícia politica do meu país.
As novas gerações têm dificuldade em entender o que realmente foi o 25 de Abril de 1974, tal como eu na minha juventude tinha dificuldade de entender o que tinha sido por exemplo o 05 de Outubro de 1910.
Mas quem viveu as proíbições as mentiras e mais grave ainda, quem teve que pegar em metralhadoras, granadas e ir defender o que nós sabíamos que não era nosso, sabe o que nos custou não só fisicamente, mas moralmente ir morrer por Pátrias que não eram nossas e ainda mais grave não era o morrer, mas sim chegar à Metropole, estropiado por toda a vida ou com sequelas psiquicas que ainda hoje atormenta grande parte dos homens do meu país.
Quando eu nasci um homem governava o meu país ha 20 anos, seu nome: António de Oliveira Salazar.
Não era um homem qualquer metido a 1º Ministro, era sim um Sr. que governava com mão de ferro o meu país, mas diga-se em abono da verdade, também com muita habilidade.
Vejamos, ele odiava os comunistas, mas também não gostava dos americanos. Quem o quisesse conhecer tinha que se deslocar a Portugal, ele sair do país, nem pensar, fê-lo uma vez apenas.
Amores, isso não era com ele, embora se diga que uma jornalista francesa esteve apaixonada por ele, ou seria o contrário?
Religião, pois então, se um homem quer dominar bem um país o melhor que tem a fazer é unir-se à Santa Madre Igreja e ele não só uniu, como instituiu o poder da Igreja.
Liberdades políticas? Nem pensar, ele é dono e senhor e quem se atrevesse a discordar lá estava a PIDE, mais tarde DGS.
Capital? Pois sim... num país onde se passava fome e onde o lema era “Beber vinho é dar de comer a um milhão de portugueses” quando ele morreu os cofres do Banco de Portugal tinham uma das maiores reservas de ouro do mundo e estavamos há 10 anos gastando horrores de dinheiro em várias frentes de guerra. Então tinha ou não habilidade? Politica, comercial, religiosa... agora vejamos no meu país até para termos um isqueiro para acender o cigarro tínhamos que pagar, isto é tínhamos que ter uma licença de porte de... isqueiro.
Claro que isto não era feito por um homem só. Tinha os seus algozes, na forma de Ministros, Secretários de Estado, indivíduos capitalistas em que metade do dinheiro da nação era deles ah e claro o Presidente da República ( de alcunha o pau-mandado) e Sua Eminência o Cardeal Patriarca de Lisboa. Tudo isto secundado por uma polícia política que praticava horrores. Por exemplo tivemos o famigerado Humberto Delgado, que se atreveu em uma entrevista aquando lhe perguntaram se ele fosse eleito Presidente da Repúbica o que faria em relação a Salazar e este respondeu “obviamente demito-o” claro assinou a sua sentença de morte, assassinado em terras de Espanha pela Pide/DGS. Vejamos isto era política, mas uma pessoa que se atrevesse a fazer algum comentário menos abonatório em relação ao poder instituído arriscava-se a ir passar uma noite, na melhor das hipóteses na PIDE/DGS e isto se não fosse reincidente, porque se o fosse tinha direito a uma ou mais sessões de tortura para confessar o inconfessável, se protestavas sobre algo de certeza eras comunista.
Assim fomos vivendo 40 anos de ditadura.
Mas o mais abominável de tudo foi a Guerra Colonial. Nós jovens fomos educados e instruídos que a nossa nação não era só Portugal, mas sim todos os países que constituíam as nossas Colonias Ultramarinas a saber: India (Goa, Damão e Diú) Guiné, Cabo-Verde, S.Tomé-e-Principe, Angola, Moçambique, Timor e ainda havia Macau, Açores e Madeira, mas estes têm outra história.
Pois, éramos e somos um país pequenino mas com uma possessão que chegou a ser a maior da história mundial. Países como a Inglaterra e França, já haviam devolvido (dado a independência) às suas Colónias, nós com o “orgulhosamente sós” travamos uma luta fraticida que não era nossa, mas o mais grave ainda, estávamos convencidos que era nossa.
Tanto que poderia ter-se evitado:
Gastos em capital, vidas, e mais grave ainda, guerras internas que ainda hoje grassam em alguns desses países.
Nossa juventude estropiada, que ainda hoje sofre de stress motivado por combates sangrentos que enfrentou.
Se em devido tempo tivéssemos dado a independência a esses países, ter-se-ia evitado o regresso compulsório de tanta gente que nesses países trabalhou e lutou por ter uma vida melhor e contribuiu de forma decisiva para o desenvolvimento económico dos países onde viviam.
Muita gente culpa o 25 de Abril de 1974 por tudo ter acabado tão abruptamente, mas não, a culpa vem de longe vem de 1958 quando os indianos quiseram o que era deles, Goa, Damão e Diú, logo ali quem nos governava devia ter-se preparado para dar a independência às nossas Colonias, mas não, perante milhões de indianos foi dada a ordem ao nosso governador para se defenderem até à morte tal não aconteceu e foi tratado como traidor.
Muito haveria a dizer, mas ao escrever este artigo, escrevo-o de memória sem consultas a livros ou a qualquer outro meio. Escrevo-o com o coração, coração de português que até não sofreu muito se me comparar aos meus irmãos.
O 25 de Abril de 1974, trouxe o direito de um povo, o direito à sua indepêndencia, à conquista dos seus valores ao ougulho de se sentir verdadeiramente português. Embora muitos erros tenham sido cometidos com a revolução, esta valeu a pena e hoje somos um povo que tem liberdade, a liberdade de se exprimir, falar e lutar pelos seus direitos.
Assim saibamos continuar para fazer de Portugal um país que vale a pena.

Recife, 15 de Abril de 2004. (*) artigo de opinião

1 comentário:

Unknown disse...

Infelizmente a realidade actual do Governo Portugues começa a estar longe da liberdade de expressao ou outras.
Os proximos anos serao decisivos para vermos se o 25 de Abril valeu a pena. Pela realidade actual, nao.