07/10/2009

Maus tempos se aproximam.

Maus tempos se aproximam.
Por Joaquim Evónio*

PORTUGAL: É entendimento geral que aos Poetas do Mundo cabe um importante papel na filosofia da Paz. Bom seria, parece-me, que essa missão se afastasse da apreciação de casos concretos actuais mais ou menos mediáticos, num distanciamento proporcionador de perspectiva, como fonte de pedagogia global e não como foco de incêndio de qualquer das partes em conflito.
Maus tempos se aproximam. O optimismo ensina que amanhã pode ser sempre pior que hoje.
A crise da globalização financeira, versão moderna que terá tido os seus primórdios nos salteadores de estrada escondidos nos pinhais doutros tempos, vai incrementar de modo significativo todos os conflitos, intra e extramuros. São presságios a desenvolver e investigar para fins cautelares.Afinal estão na moda palavras que pertenciam à reserva do léxico: proteccionismo, xenofobia, clientelismo, nepotismo, corrupção, egoísmo e etnocentrismo. Para já não falar na concepção antropocêntrica do Mundo.
Políticos de todas as latitudes unem-se para salvar o umbigo próprio e o dos amigos cúmplices.
Há uns meses tentei resumir essas preocupações no texto anexo: 'Neguentropia, Altermundialismo e Direitos Humanos'.
Também me parece verdade que não vale tudo e que o próprio conflito gera regras para o seu exercício, abordagem a que dediquei algum tempo nos anos oitenta do século passado, sob o título: 'A Função Unificadora do Conflito' (ver em Ensaios)
Votos de que a Paz Universal venha a tornar-se o cimento de toda a convivência entre pessoas, países e religiões.


NEGUENTROPIA, ALTERMUNDIALISMO E DIREITOS HUMANOS.
Por Joaquim Evónio*

Quase tudo está dito, de forma descritiva, interpretativa ou apologética, sobre os Direitos do Homem e respectivo Estatuto mas, como diria Pessoa, só falta cumprir... a Humanidade.
Há pois que entender que o Espírito da Lei e a Consciência Ética deverão ser prevalecentes sobre o seu conteúdo, sob pena de não chegarmos a parte alguma e de contribuirmos para desacreditar a própria lei.
Chamo assim a atenção para a moldura geral em que me parece deverem ser reiterados e repensados os Direitos Humanos.
A globalização que ora percorre a Aldeia Mundial, em si própria, só se tornará perversa se assim o quisermos ou consentirmos.
Reflictamos sobre a Morada em que vivemos para passar o testemunho.
O Homem é o único ser vivo com capacidade para vencer volitivamente a 3.ª Lei da Termodinâmica. Situado num ecossistema de que também faz parte, tem capacidade para o alterar e instabilizar, tanto para o bem como para o mal.A Terra pertence igualmente a todos e não reconhece favoritos.
Há pois que salvaguardar o planeta, nossa morada, de todas as ameaças que vimos acumulando. O diagnóstico está feito. Que esperam os grandes poderes que nos conduzem para o abismo?
GLOLOC significa a preocupação com os grandes espaços e, simultaneamente, com as mais pequenas Comunidades. O Global e o Local terão de conviver em harmonia sinérgica.Cada comunidade, por mais pequena que seja, pode constituir-se como pólo de desenvolvimento cultural, no sentido civilizacional. O desenvolvimento não é um crescimento maior, mas uma mudança de sinal, baseada em alterações ou ajustamentos estruturais. E de mentalidade também.
Quando gerimos comunidades e queremos salvaguardar um futuro próspero ou feliz, temos de tomar, hoje e antes que seja tarde, as devidas medidas estruturantes.Quem tem força para fazer a Guerra, terá de usá-la prioritariamente para fomentar ou instaurar a Paz.
Haveremos de continuar a viver num contexto em que os factores geográficos são os mais estáveis, dando origem a diversas correntes geopolíticas.Pena que, como já alguém disse, o Homem tenha alcançado o domínio da técnica antes de atingir a dignidade humana.
Cada país terá de aprender a encarar os outros países da mesma forma que o eu deve comunicar com o outro: de igual para igual. Trata-se apenas de transpor o conceito de Alteridade para o do convívio global. A isso se chama Altermundialismo.Nas relações bi ou multilaterais, necessário se torna esclarecer e fortalecer a identidade pessoal, bem como a identidade cultural das comunidades, pois só assim é possível compreender e respeitar o outro e as outras comunidades.
Claro, o economicismo e as ciências físicas ter-se-ão sobreposto às humanas. Há que inverter o processo enquanto for tempo, o que quer dizer desde já.Ainda há dias li algures que para salvar o Homem o Mundo terá de deixar de ser antropocêntrico.
As Ciências Sociais, ou Humanas, têm pois um grande papel a desempenhar neste mundo tecnocrático e economicista.Aqui chamaria a atenção para dois conceitos distintos: o de Comunidade e o de Sociedade. Gemeinshaft e Gesselshaft, como lhes chamou o sociólogo alemão Ferdinand Tönnies.Na Comunidade prevalecem as relações de vizinhança, na Sociedade as relações por divisão de trabalho.
O Comércio Justo terá de ser uma realidade despida de qualquer hipocrisia ou proteccionismo. Estão em causa os magnos problemas da Humanidade. Há que praticar uma enculturação saudável e desinibida.
Um dia, um conhecido prémio Nobel da Literatura disse que a melhor maneira de construir uma ponte era mostrar aos habitantes das duas margens que tinham vantagem em encontrar-se. E a ponte apareceria feita.
Nós, poetas e prosadores, pensadores e filósofos de mar aos pés, seres de diálogo emocionados com a comunicação, somos verdadeiros construtores de pontes… E somos tantos… E elas serão tantas que todos esses tramos representarão nervuras virtuais percorrendo os céus, românicas ou góticas, desenhando uma abóbada virtual digna dum Nimeyer cósmico, apenas visível pelos iniciados que ali colocaram com acrisolado amor o tecido fino da palavra solidária!
Poderemos então dizer, com toda a propriedade, que temos capacidade para construir uma autêntica Catedral, Mesquita ou Sinagoga sobre os Oceanos, porto-de-abrigo e de encontro depois de tanto navegar…
E à Lusofonia, pelo seu reconhecido sentido ecuménico, estará certamente reservado um papel relevante na harmonização do mundo louco que ajudámos a edificar sobre as ruínas da dignidade humana.Os mares e oceanos, afinal, não passam de rios com as margens sedentas de pontes.
A Humanidade terá de ter um futuro pacífico pois, se não for pacífico, também não será futuro.
Isto se quisermos que os vindouros, e muitos deles já cá estão, propugnem a felicidade digna em vez da excelência enganadora.
A comunicação será sempre um “equivalente funcional do espaço e do tempo”, como me ensinou uma vez o sociólogo Wolf Dombrowski, da Universidade Católica de Kiel. Muito mais em situação de emergência, em que a informação se torna essencial.
No mundo globalizante em que vivemos, os traços fundamentais da soberania vão-se transmutando com o tempo. Mas a identidade não. A língua acabará por ser a sua marca mais perene, correspondendo à herança cultural profunda, depois do maior ou menor esbatimento de fronteiras ou união de economias que aparentem diluir a histórica geografia política.
As línguas comportam-se como organismos vivos, através dum longo processo de construção, desconstrução e releitura espacial e temporal. O seu múnus, no entanto, parece projectar-se sempre na quase intemporalidade do futuro longínquo, expandindo as marcas indeléveis da sua origem.
Se o mundo que Toynbee dividiu em duas eras históricas – pré e pós-gâmica – vier um dia a reconhecer-se numa bandeira comum, a esta não poderá faltar a presença da lusofonia, enquanto cimento e sinal de paz e união.E que a “Última flor do Lácio”, de Bilac, estenda as suas pétalas, quais velas donairosas, às catedrais, mesquitas e sinagogas de todo o mundo.
Assim se cumpra a vontade dos Poetas do Quinto Império, que se dão as mãos, ondas, braços do oceano e se aprestam a navegar por esses mares sem fim, por mais desafiadoras e turbulentas que sejam as águas.Ainda vale a pena sonhar e, como “o trabalho não é uma alienação”, esperemos o dia em que capital e trabalho, irmanados nas suas responsabilidades e objectivos, se sentem amigavelmente num banco de jardim, admirem as flores e escrevam o Poema do Futuro.
Um mundo global clama para uma pedagogia global que, junto de cada um de nós e de todos, evidencie e propugne os valores incontornáveis do ambiente e da identidade do eu e do outro, tudo projectado para a escala maior da Humanidade.

Joaquim Evónio POETA del MUNDO: